O posicionamento
esposado nesta expressa indignação se impõe diante da insatisfação social que
cresce em nosso país, fruto dos desmandos governamentais, da corrupção
institucionalizada e da impunidade garantida. Se a corrupção é um mal congênito
que resiste aos tempos, desafiado por vasta e ineficaz previsão legal, criar
mecanismos de prevenção, aprimorar a legislação e impedir a perpetuação da
impunidade é obra possível e ao alcance de uma sociedade fraterna e igualitária,
comprometida com a realização do bem comum.
Pretendo nesse pequeno
espaço fazer um diagnóstico do nosso sistema político que se mostra poroso e
permeável às criminosas investidas que visam assaltar o erário público, propor
alternativas, e demonstrar que é possível transformar o inconformismo passivo
que amordaça nossa gente e engessa a indignação, numa vigorosa ação coletiva,
pacífica e suprapartidária, reunida em torno de um objetivo único chamado
Brasil, ancorada no princípio da não violência e na desobediência civil.
Indignação, atitude e
anseio por justiça movem esta ação para promover uma reforma política sem as
digitais dos atuais legisladores, sem a mancha do poder econômico e sem o
carimbo dos interesses externos, que contemple as reais aspirações do povo, e
seja capaz de realizar mudanças que traduzam a vontade popular, fortaleçam o
sistema de representação, e assegurem a igualdade, a liberdade e a justiça.
A sociedade brasileira não suporta
mais um poder executivo cuja governabilidade depende do loteamento de cargos,
da liberação de emendas espúrias e da compra de votos, onde a gestão se mostra
incompetente e cúmplice do assalto ao erário público; um legislativo sem
representatividade, desmoralizado pela ação nada republicana de seus caricatos
componentes; um poder judiciário parcial e partidarizado no topo das decisões,
cuja composição depende dos outros poderes; um tribunal de contas subordinado
aos interesses daqueles que deveria fiscalizar, onde os conselheiros que julgam
as contas não possuem independência.
De outra banda, nada podemos esperar
de bom da bancada oposicionista, sustentada pelos mesmos pilares que mantém e
operam um sistema viciado e corrupto. Saciada com os restos de um governo em
frangalhos, a oposição assiste o racha do governo de cooptação, cozinha o
frango em banho-maria, enquanto opera-se o desgaste total do desafeto político
para servir no banquete marcado para noventa dias antes das próximas eleições.
Assim, deverá o povo brasileiro aguardar
quatro anos pelos “salvadores da pátria”, que, como os que saem também nada propõem,
restando-nos a certeza de que os algozes habituais continuarão espoliando os
recursos de nossa nação.
O resultado desta equação é a ausência
de políticas públicas sérias, falta de credibilidade das Instituições e um governo
sem rumo, enfraquecido, dividido, à deriva, acuado pelas demandas populares, acossado
pelos pleitos corporativistas, pressionado pela oposição corrosiva e refém de um
congresso venal, fomentando o clima de convulsão que tem levado milhões de
pessoas às ruas exigindo mudanças, e a responsabilização penal dos intocáveis.
No Brasil, intocáveis são pessoas
que, usando de suas atribuições constitucionais, decidiram se organizar em
quadrilhas para drenar recursos do estado, em constante e robusto assalto ao
erário público. Estão confortavelmente instalados em todos os poderes, e, com o
produto da espoliação e as prerrogativas do cargo, garantem a impunidade ad aetertum e perpetuam-se no poder. Há
também os “grandes empresários” em permanente estado parasitário, sugando o
caixa do estado à exaustão, e utilizando a verba arrecadada na calada da noite
para escaparem impunes.
Na Índia, os intocáveis são párias, fora-de-casta, no sentido hindu do
vocábulo, significando que eles não pertencem a qualquer das quatro castas
hindus, que são, da superior para a inferior: os brâmanes ou sacerdotes, os
xátrias ou governantes e guerreiros, os vaixás ou comerciantes e lavradores e
os sudras ou artesões. Abaixo dessas castas, mas muito no fundo, de modo a não
poder enquadrar-se nem sequer no último degrau da escala social hindu, é que
vem o pária, ou o intocável, que é o hindu de fora da paliçada.
A princípio, o nome parece ser a
única semelhança entre os intocáveis, mas não é, senão vejamos:
Até mesmo a sombra de um intocável é considerada impura, em algumas zonas
da Índia. Obviamente, portanto, os intocáveis não devem entrar num templo
hindu. Habitam os piores setores dos piores cortiços do mundo, e, nas aldeias,
vivem nos mais infectos arredores, para onde se drenam os esgotos e as águas
servidas; mas o uso do poço lhes é vedado. O poço passaria a ser poluído. (FISCHER, Louis.Gandhi, publicado
sob licença pelo Circulo do Livro, pág.160)
Como verificamos, maus brasileiros
conseguiram transformar o nome que revela a abominável e institucionalizada
prática de descriminação dos seres humanos, em uma casta de privilegiados e
criminosos fora do alcance da lei. Assegurada a impunidade, campeia a corrupção
e amplia-se o cenário de calamidade pública que inviabiliza a vida de milhões
de brasileiros.
O local onde chafurdam é o mesmo destinado
aos indianos em situação de vulnerabilidade social. O cenário descrito espelha
também a realidade vivenciada por brasileiros em praticamente todas as cidades
do país, aqui chamados de companheiros, coxinhas, brasileiros e brasileiras... dependendo
do governo de plantão.
O que fazer?
Após a escuridão que durou vinte e um
anos, as mobilizações sociais se restringiram aos movimentos organizados por
categorias sindicais e aos embates eleitorais polarizados.
Neste período, o Brasil resistiu
bravamente às tentativas isoladas de dividir a nação entre ricos e pobres,
pretos e brancos, cristãos e não cristãos, norte e sul, esquerda e direita, garantindo
o respeito à diversidade e mantendo nossa unidade territorial, social,
econômica e política indevassável.
Assim, promulgamos nossa constituição
democrática em 1988, considerada uma das mais avançadas do mundo, contemplando os
princípios fundamentais, direitos e deveres, a organização do Estado, a
organização dos poderes...
É inegável que os ventos democráticos
sopraram forte no país continente, rico por natureza e pobre por opção,
fortalecendo a cidadania e democratizando as Instituições.
Mas não foi suficiente. Depois de experimentar
a governança de todos os matizes sob a égide da Carta Maior, verificamos que a
desigualdade social perdura, a economia recrudesce e a política apodrece.
A política apodrece, e a quem diga
que é, e sempre será podre. Prefiro ver a política como uma ação que transforma
a realidade social para melhor, dependente da participação efetiva do cidadão e
que requer eterna vigilância.
O Brasil literalmente não sabe aonde
quer chegar. Não temos um projeto de nação de longo prazo, apagamos o incêndio
das questões conjunturais e recusamos o enfrentamento das questões estruturais.
Nas últimas eleições, mais uma vez, legitimamos
um processo anacrônico que permite a dois ex-presidentes escolherem a dedo seus
candidatos à presidência do Brasil, para depois, tal qual um voto de cabresto
moderno, sem opção, sufragarmos nas urnas estes nomes em razão de um suposto
exercício de cidadania.
Legitimar um processo eleitoral com
cartas marcadas é exercício de cidadania?
Esses dois senhores lideram dois
partidos políticos (PT e PSDB) que detêm, respectivamente,
1,12% e 0,96% do eleitorado total em suas infladas fileiras partidárias,
enquanto o maior partido de aluguel do país (PMDB), que atua como fiel da
balança cortejando os dois lados detém míseros 1,66% no seu quadro de filiados,
recheado de ausentes.
Assim, ao autorizar tamanha
concentração de poder, o sistema atual permite um pequeno grupo se alternar no comando
do país, onde os dois primeiros se revezam no executivo e controlam o caixa,
enquanto o partido camaleão mantém a presidência das duas casas legislativas, e
controla o mercado de trocas em que se transformou o congresso nacional.
O resultado do último pleito presidencial
revela uma legião de inconformados, e uma substancial adesão
comprometida com o voto útil e o voto de protesto, senão vejamos:
DILMA: 54.501.118 - votos válidos -
(51,64%)
AÉCIO: 51.041.155 - votos válidos -
(48,36%)
NENHUM DOS DOIS: 37.279.085
Assim distribuídos:
BRANCOS: 1.921.819 votos
NULOS: 5.219.787 votos
ABSTENÇÃO: 30.137.479 votos
Se considerarmos o total dos votos,
temos a seguinte participação:
TOTAL: 142.821.358
DILMA: 38,16%
AÉCIO: 35,74%
NENHUM DOS DOIS: 26,10%
Considerando que parcela
significativa do eleitorado que votou nos dois candidatos utilizou o voto útil e
o voto de protesto por não ter opção, e que, no mínimo 50% dos eleitores da
presidente mudariam de voto após as eleições/2014, temos um quadro de
instabilidade política grave, exigindo mudanças estruturais que foram
postergadas por não interessarem aos detentores do poder.
Assim, urge uma reforma política que
acabe com a manipulação do eleitorado brasileiro, mas que não pode ser conduzida
pelos atuais legisladores, pois é farinha do mesmo saco.
Como fazer?
Timidamente, sem lhes reduzir a
importância, nos últimos anos acompanhamos pequenos grupos se organizarem para
protestar contra a corrupção. Reunem-se em torno de um objetivo comum e escolhem
um nome: cansei, basta, chega... e na semana seguinte ao protesto amplamente
divulgado, não resistem a indiferença da população e ao escracho da mídia.
Mas, quais seriam os motivos pelos quais
esses legítimos movimentos não conseguem galvanizar a indignação popular?
Sugerimos nesse espaço algumas possibilidades
para reflexão, pois entendemos que estes movimentos avaliam o fracasso dos
projetos a partir de premissas equivocadas, a saber:
•
Quantidade de pessoas que comparecem ao evento.
A pequena quantidade de pessoas que
comparecem aos eventos que lutam contra a corrupção, apesar das boas intenções,
no dia seguinte, voltam-se à defesa do status
quo assegurado até aqui, descurando do trabalho árduo e monumental que será
a guerra para reformar este país.
Os bem intencionados comparecem ao evento
como se fossem ao parque de diversão. São os críticos de pequenas rodas, muita
eloquência e nenhum resultado. A verdadeira reforma não é um evento festivo de
final de semana, não pode ser frustrada pela quantidade reduzida de adesões, e
será conduzida por pessoas que efetivamente estiverem determinadas a mudarem o
Brasil.
•
Repercussão na Mídia.
As ações propostas até aqui, aguardam a
repercussão na mídia para medir o êxito da empreitada e decidirem se persistem
no projeto.
Ledo engano, as avaliações necessariamente
passarão pelo filtro dos interesses da imprensa em conformidade com seus
patrocinadores e posicionamento político.
Diante da cumplicidade entre a grande
imprensa, o governo de plantão e o conservadorismo predatório, o movimento
efetivamente transformador não pode pautar suas ações pelo resultado midiático
e deve utilizar as mídias alternativas.
•
Projeção Pessoal.
As lideranças que se apresentaram até aqui buscam
projeção pessoal e não lutam efetivamente para mudar o Brasil. As pseudo-lideranças
ocupam espaços na mídia durante algum tempo, e, sem registrar nenhuma obra
consistente na direção das mudanças, se apresentam como candidatos na próxima
eleição.
Quando debocharmos deste candidato caricato
na TV, estaremos rindo da nossa própria tragédia e fatalmente decretando nosso
destino.
· Prazo.
Meta de curto prazo é um erro.
A reforma não é uma medida provisória e sim
uma medida permanente.
•
Desprezo à Participação Popular.
Segmentados e sem representatividade, os
movimentos com origem na classe média, seletivamente organizada, não possuem
base popular, e por isso estão fadados ao fracasso.
A classe média (a, b, c, d, e) é vítima de um
processo que apartou de um lado as classes menos favorecidas, contempladas pelo
assistencialismo, e de outro a classe rica que não depende das políticas
públicas, e mantém extrema e competente vigilância sobre as iniciativas que
visam redistribuir a carga tributária.
Neste cenário, o recheio, pressionado, não é
protagonista nem coadjuvante, mas paga a conta. Tanto é que a carga tributária
que recai sobre os contribuintes é insuportável para a classe média,
desprezível para os ricos e isenta para os menos favorecidos.
O movimento que se propõem mudar para
melhor nosso país tem que ter foco, credibilidade e determinação para envolver
todo o povo brasileiro, independentemente da sua condição social.
Precisa se afastar do salão oval, do bric da redenção
em manhã ensolarada de domingo e percorrer as comunidades carentes, realizar
reuniões em ambientes soturnos, confrontar sua pregação com a aridez do mundo
real, converter lideranças comunitárias de que é possível viver sem a proteção
do traficante, sem trocar o voto no vereador por um prato de comida, e recusar o
assistencialismo governamental sem critério que acaba cobrando seu preço da
forma mais perversa, ou seja, ausência de políticas públicas sérias na área de
saúde, educação, segurança, saneamento básico, cultura e lazer, e tem como
consequência a exclusão social, a desigualdade e a falta de oportunidade.
Precisa mobilizar uma classe média com
vergonha de exercer plenamente seus direitos políticos recém conquistados, que
hesita entre o individualismo e o interesse coletivo, que sofre as
consequências e se conforma com a opressão estatal, que, pelo grau de escolaridade
e politização, carrega o ônus de ter se transformado numa manada intelectualizada
a serviço de um estado perdulário e corrupto, que precisa sair do estado de
letargia em que se encontra e lutar pelo bem comum.
Precisa convencer o topo da pirâmide que
conquistou seu robusto patrimônio honestamente, de que a luta por um estado
verdadeiramente republicano não ameaça seu capital, pelo contrário, depender de
quadrilhas encasteladas no poder é que representa um risco para a segurança, a
manutenção do status quo, e a
estabilidade institucional.
Precisa conectar com um aríete que perpassa
todos os segmentos apontando para o futuro, e que precisa estar junto nesta
campanha, é o jovem brasileiro.
Frequentando escolas e faculdades, plenamente
inteirados das demandas nacionais e mundiais, os jovens possuem destemor,
conhecimento e determinação para o embate, anseiam por um país democrático com
igualdade de oportunidades, repudiam os feudos políticos e a corrupção que
condena milhões de pessoas à miséria física e intelectual, numa nação que tem
condições de atender plenamente as demandas de seu povo.
Como Fazer a
Mudança Sem Violência?
Temos a excepcional oportunidade de
recorrer ao passado para buscar conhecimento, experiência e decidir como
faremos a reforma.
Os movimentos que ocorreram no Brasil
em abril, mobilizando milhões de pessoas, demonstraram que é possível protestar
e pedir mudanças, sem recorrer à violência e sem destruição do patrimônio
público.
De negativo, no meu sentir: faltou
foco, sobraram interesses corporativos, foi partidarizado, sem liderança, e não
apresentou propostas.
Já, as mobilizações de junho de 2013,
provocadas na esteira de movimentos mundiais, fizeram exsurgir a figura do
jovem no campo de luta política e tinham foco bem determinado (aumento das
passagens), tinham método (ocupação de espaços públicos), não permitiram a
partidarização nem a utilização do bloco de lutas para a reivindicação de
interesses corporativos, e mostraram determinação para atingir os objetivos.
De negativo: violência e destruição
do patrimônio público (como opção de luta ou praticada por elementos
infiltrados); ausência de liderança capaz de assumir a responsabilidade; não
consolidação do apoio da população, diante da violência praticada.
A história mundial traz três exemplos
de lutas empreendidas com sucesso utilizando o princípio da não violência, e
ações articuladas baseadas na desobediência civil, assim:
"Não resistais ao
mal" (Mateus 5,39)
Outro dia assisti novamente ao filme
sobre a vida e obra de Mohandas Gandhi, o Mahatma, depois de ter lido o livro
usado na produção.
Ainda na África do Sul, lutava ele
por direitos mínimos, tentando superar o preconceito racial e econômico que
pairava sobre aquelas bandas, espoliando os nativos e esfolando de forma
desumana a mão de obra importada da Índia.
Quando retornou ao seu país não foi
diferente, adicionando a extensa pauta de violações de direitos humanos, a
liderança na luta pela independência do seu povo, súdito secular do Império
Britânico. Na guaiaca, sob a veste branca e única, duas armas poderosas já
experimentadas, a desobediência civil e o princípio da não violência.
O soberbo colonizador não demoraria a
se curvar diante de tamanha força moral e invencível determinação.
“A não-violência é o artigo número um de minha fé – e é também o último
artigo de meu credo”. Mohandas Gandhi
Anos depois, um jovem americano
dobraria a coluna vertebral da máquina mortífera da propaganda norte-americana
- discurso pacifista e prática belicista - que, ainda na segunda metade do
século XX, segregava os afrodescendentes, tirava-lhes o couro e derramava seu
sangue no solo “mais” democrático do mundo
.
Martin Luther King, do púlpito, sacou
do coldre as armas empregadas com sucesso por Gandhi, a desobediência civil e o
princípio da não violência.
"O que mais
me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos
sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos
bons" Martin Luther King, JR
Recentemente, Nelson Mandela, o notável
estadista sul africano, serenamente subiu aos céus com o símbolo da paz
esculpido em sua face. Mandela venceu todas as barreiras impostas pela
intolerância, acabou com o apartheid,
curvou o agressor sem humilhá-lo, compartilhou os direitos arduamente
conquistados e conduziu seu povo para uma convivência harmoniosa, respeitosa e
pacífica.
Da cadeia, acorrentado aos grilhões, manejou
com sabedoria as mesmas armas de Gandhi e Martin, a desobediência civil e o
princípio da não violência.
"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua
origem ou ainda por sua religião.
Para odiar, as pessoas
precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar." Nelson
Mandela
Desafio comum aos extraordinários
líderes foram os enfrentamentos em tempo integral, com refinada maestria e
determinação, das pequenas grandes violações suportadas por seus povos, como:
não poder frequentar as escolas dos brancos, as lancherias, os cinemas, os
ônibus, os clubes, os sanitários... não transitar na mesma calçada, não olhar nos
seus olhos, não tocá-los...vulnerabilidade social, empregabilidade, desigualdade,
insegurança jurídica...ausência de saneamento básico, de serviços médicos, de moradia,
de acesso à educação...condições insalubres e carga de trabalho insuportáveis.
Mais, não tinham direito ao voto ou,
se tinham, eram impedidos de votar ou assistiam perplexos e impotentes, a
violação das urnas e a manipulação dos resultados, perenizando o repertório de
violações a que eram submetidos pelo agressor contumaz.
Comungaram também da luta contra o
radicalismo dentro da própria trincheira que ansiava pela retaliação armada. A
guerra vencida é o resultado de batalhas travadas no seio dos insurgentes em
busca da unificação de objetivos e, principalmente, quanto ao método empregado.
“Dividir para vencer” é o lema
consagrado pelo inimigo. Superar esta máxima e fazer prevalecer o princípio da
não violência, com ações baseadas na desobediência civil foi, talvez, o maior
desafio enfrentado pelos excepcionais comandantes da paz.
Mas, em que se assemelham estes gigantes
dotados de ilimitada capacidade de persuasão, de intransponível repúdio ao
recurso das armas, de inesgotável espírito de conciliação e invencível
determinação para a realização dos seus sonhos?
Levantamos algumas pistas para análise:
em comum a fé num ente superior; incondicional adesão ao princípio da não violência
como reação; desobediência civil para a ação; integridade, honestidade; caráter;
altruísmo; renúncia pessoal; destemor; respeito à diversidade; verdade;
justiça; felicidade coletiva; a paz.
Da conduta compartilhada extraímos
ainda a receita de êxito vendida a peso de ouro para os administradores
modernos: foco; capacidade de reduzir atritos e administrar conflitos;
insuperável determinação para realizar os objetivos.
Seriam deuses?
Sabiam que não, seus irmãos especulavam,
e os desafetos, na dúvida, tramavam para segregar os homens e devolver os
deuses para o céu.
Mesmo assim, há quem busque num
pequeno deslize, numa eventual contradição, num erro ou mesmo numa mentira
plantada, o motivo para abalar a reputação, macular a trajetória e fulminar o legado
do trio que ousou desafiar e vencer os agressores rejeitando a opção pelas
armas, adotando o princípio da não violência e praticando ações apoiadas na desobediência
civil.
Como dizia minha querida e amada avó,
Juliana Hedwig Klein Orsi, “a perfeição
nos aproxima do Senhor, a imperfeição nos torna humanos”.
Muito se escreve neste mundo. Há receita para tudo, de como fazer um
bolo a como resolver as diferenças à bala. Gandhi, Luther king e Mandela adotaram,
confrontaram e comprovaram na prática os ensinamentos contidos na Bíblia e no
Livro Sagrado dos Hindus, nas experiências pessoais extraídas dos ensaios de Henry
David Thoreau e de Leon Tolstói, o que não reduz seus feitos, pelo contrário,
pois, vencer a intolerância com a espada da tolerância, a violência e as armas com
o princípio da não violência, o agressor com a desobediência civil e o mal com
o bem, só foi possível através da entrega desmesurada e incondicional desses homens
em prol da humanidade.
Discurso e conduta experimentados no
limite do impossível a serviço da Paz.
O legado inspirado na
obra de Thoreau (A Desobediência Civil), de
Tolstói (O Reino de Deus está em Vós), na
Bíblia (Sermão da Montanha), e no
Livro Sagrado dos Hindus (Bhagavad-Gita),
se mostra irretocável, encontrou três
executores à altura do desafio, com força propulsora própria, fé inabalável,
destemidos e de caráter inquebrantável, que não hesitaram em perder a liberdade
e enfrentar a morte em defesa da vida.
Nossos ícones foram
ainda mais longe na luta pela paz. Princípio da não violência e ações
articuladas de desobediência civil é meio, e não fim.
Meios que visam acabar
com a agressão e não com os agressores, morrer, mas não matar pela causa,
compartilhar ganhos sem humilhar os adversários visando a sincera e harmoniosa reconciliação
nacional.
O objetivo último é inegociável
e absoluto, o respeito à vida, a convivência fraterna, respeitosa e pacífica
entre os seres humanos, num ambiente de liberdade, igualdade e paz.
Resumindo: definir o
objetivo, adotar a desobediência civil em confrontos com o governo - se houver
resistência para as mudanças - reagir seguindo o princípio da não violência,
respeitar o adversário, preservar a vida e buscar a paz.
No meu entendimento
esse é o caminho que devemos trilhar com seriedade e determinação, pois possuímos
condições extremamente favoráveis para adoção desse meio de luta, diante do temperamento
do nosso povo e da experiência exitosa de Gandhi, Luther king e Mandela, que
haverão de nos guiar e iluminar.
“Se ninguém responde ao teu chamado,
caminha sozinho, caminha sozinho”. Canção preferida do
indiano Rabindranath Tagore, amigo de Gandhi, prêmio Nobel de literatura em
1913.
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