República Árabe Saharaui Democrática


O POVO QUE O MUNDO ESQUECEU


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Bem-vindos ao blog phoenixsaharaui.blogspot.com.br


A criação deste espaço democrático visa: divulgar a causa Saharaui, buscar o reconhecimento pelo Brasil da República Árabe Saharaui Democrática e pressionar a União Européia, especialmente a Espanha, a França e Portugal, mais os EUA, países diretamente beneficiados pela espoliação dos recursos naturais do povo Saharaui, para retirarem o apoio criminoso aos interesses de Mohammed VI, Rei do Marrocos, e com isto permitir que a ONU prossiga no já tardio processo de descolonização da Pátria Saharaui, última colônia na África.


Membro fundador da União Africana, a RASD é reconhecida por mais de 82 nações, sendo 27 latino-americanas.


Nas páginas que seguem, você encontrará notícias do front, artigos de opinião, relato de fatos históricos, biografias de homens do porte de Rosseau, Thoreau, Tolstoy, Emersom, Stuart Mill e outros que tiveram suas obras imortalizadas - enxergaram muito além do seu tempo - principalmente em defesa da Liberdade.


"Liberté, Égalité, Fraternité", a frase que embalou tantos sonhos em busca da Liberdade, é letra morta na terra mãe.


A valente e obstinada resistência do povo Saharaui, com certeza encontraria em Jean Molin - Herói da resistência francesa - um soldado pronto para lutar contra a opressão e, em busca da Liberdade, morrer por sua Pátria.


A Literatura, a Música, a Pintura e o Teatro Saharaui estarão presentes diariamente nestas páginas, pois retratam fielmente o dia-a-dia deste povo, que a despeito de todas as adversidades, em meio a luta, manteve vivas suas tradições.


Diante do exposto, rogamos que o nosso presidente se afaste da posição de neutralidade, mas que na verdade favorece os interesses das grandes potências, e, em respeito a autodeterminação dos povos estampada como preceito constitucional, reconheça, ainda em seu governo, a República Árabe Saharaui Democrática - RASD.


Este que vos fala não tem nenhum compromisso com o erro.


Se você constatar alguma imprecisão de datas, locais, fatos, nomes ou grafia, gentileza comunicar para imediata correção.


Contamos com você!


Marco Erlandi Orsi Sanches


Porto Alegre, Rio Grande do Sul/Brasil

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

APROXIMAÇÕES ENTRE O COMBATE À GUERRILHA DO ARAGUAIA E O OPERATIVO INDEPENDENCIA NA ARGENTINA: PRECEITOS DA GUERRE RÉVOLUTIONNAIRE NO CONE SUL


APROXIMAÇÕES ENTRE O COMBATE À GUERRILHA DO ARAGUAIA E O OPERATIVO INDEPENDENCIA NA ARGENTINA: PRECEITOS DA GUERRE RÉVOLUTIONNAIRE NO CONE SUL

* Caroline Silveira Bauer

Texto completo: http://revistahistoriauft.files.wordpress.com/2012/04/aproximac3a7c3b5es-entre-o-combate-c3a0-guerrilha-do-araguaia-e-o-operativo-independencia-na-argentina-preceitos-da-guerre-rc3a9volutionnaire-no-cone-sul.pdf

Parte:

RESUMO

Este artigo estabelece uma comparação entre as estratégias repressivas empregadas pelos militares brasileiros no combate à Guerrilha do Araguaia e pelas Forças Armadas argentinas no chamado Operativo Independencia, realizado no ano de 1975 para eliminar a guerrilha rural na região de Tucumán, no noroeste argentino. Ambas as ações foram orientadas por preceitos da Guerra Revolucionária, uma teoria militar desenvolvida pela França para a luta contra movimentos insurgentes.

Introdução

Este artigo discute parte das reflexões desenvolvidas para a elaboração de minha tese de doutorado (BAUER, 2011), que, em sua primeira parte, apresenta uma análise comparativa entre as estratégias de implantação do terror das ditaduras civil-militares argentina e brasileira, mais especificamente, do emprego do desaparecimento como componente das ações repressivas. Buscando as origens dessa prática e comparando as ações militares desenvolvidas no combate à Guerrilha do Araguaia1 e na execução do Operativo Independencia,2 evidenciou-se que ambas as operações, mesmo situadas em conjunturas políticas diferentes nos dois países, estiveram pautadas pelo emprego dos preceitos da Guerra Revolucionária.

A França e a Guerre Révolutionnaire

A Guerre Révolutionnaire, ou Guerra Revolucionária (GR), era uma concepção militar francesa que foi desenvolvida a partir da experiência da guerra colonial de libertação nacional ocorrida na Indochina (1946-1954).

A doutrina elaborada para o combate desta que não era uma guerra convencional – o que exigiu a aplicação de métodos igualmente não convencionais – seria aprimorada durante a Guerra da Argélia (1954-1962), principalmente após a Batalha de Argel (1957).

“A principal característica desta forma de conflito era a indistinção entre os meios militares e os não militares e a particular combinação entre política, ideologia e operações militares que ela punha em funcionamento.” (MARTINS FILHO, 2004:[s. p.])3

Assim, a GR extraiu seu nome, sua estratégia e seus métodos daquilo que visava combater, em um “efeito espelho” (LEMOINE, 2004), no qual o inimigo seria derrotado através da utilização das mesmas armas que empregava.

Complementarmente, a teoria abrangia uma estratégia e métodos que incluía um eficaz sistema de informações organizado mediante a quadriculação do território, a utilização de centros clandestinos de detenção e interrogatório, o emprego das torturas físicas e psicológicas como forma de obter dados, a “reconversão” dos presos políticos e a eliminação dos militantes através de esquadrões da morte ou do desaparecimento.

Todas essas práticas, teorizadas por militares franceses como Roger Trinquier, bastante lido pelas Forças Armadas argentinas e brasileiras (LLUMÁ, [s. d.]: 15), configuravam “ações psicológicas” fundamentais para “apropiación de las almas […] que deberá ‘canalizar las energías, las voluntades, los entusiasmos, los amores, los odios’, lo que servirá también para la recuperación o conversión de prisioneros, después de haberlos quebrado mediante ‘la brutalidad’ […].”(OLIVEIRA-CÉZAR, [s. d.]: 72)

A operação policial-militar que ficaria conhecida como “a batalha de Argel” transformou-se em um modelo francês de combate à GR. Tratou-se de uma operação onde foram postas em prática uma série de estratégias – como a quadriculação do território e a utilização de centros clandestinos de detenção e interrogatório – e métodos que seriam exportados a outros países, tais como a importância das informações, a utilização da tortura como forma de interrogatório, e os desaparecimentos.

Posteriormente, em 1966, o cineasta italiano Gillo Potencorvo lançou o filme  ntitulado “A Batalha de Argel” como forma de denunciar as práticas empregadas pelas forças de segurança francesas no combate à FLN. Paradoxalmente, o filme foi utilizado pelas Forças Armadas de diversos países – inclusive argentinos e brasileiros – como forma de instruir os militares no combate à GR, devido à verossimilhança com os fatos ocorridos em Argel.

Cinicamente, ao ser perguntado se assistira à produção, Paul Aussaresses afirmou: “Sí, es magnífica. Muy próxima a la verdad. No se puede hacer mejor, está muy bien interpretada” (EL CONCEPTO, [s. d.]). Na Argentina, o filme era utilizado durante as instruções militares e na introdução aos estudos da doutrina da GR desde 1967 (ROBIN, 2005: 308).

Todos esses elementos foram fundamentais para a formulação das estratégias de implantação do terror das ditaduras civil-militares de segurança nacional argentina e brasileira.

A Recepção da GR pelos Militares Argentinos e Brasileiros

A doutrina francesa teve uma ampla receptividade nas Forças Armadas argentinas e brasileiras, pois ambas necessitavam desenvolver uma resposta para o problema que julgavam ameaçar a política da década de 1950 e seguintes: o peronismo, na Argentina, e o varguismo, no Brasil.

O suicídio de Getúlio Vargas no Brasil em 24 de agosto de 1954, motivado por uma situação de impossibilidade da política devido à desestabilização de seu governo e as constantes ameaças de golpe militar – que voltariam a se repetir nos anos seguintes –,4 e a eclosão da Revolución Libertadora na Argentina em 16 de setembro de 1955, que enviou Perón para um exílio de 18 anos e prescreveu o peronismo, são indícios da identificação dos militares argentinos e brasileiros de que ambos os momentos representavam uma fase da guerra revolucionária em curso.

Quando a doutrina francesa chega ao Brasil, os militares concluíram que a guerra revolucionária estava em curso no país desde o levante comunista de 1935 (MARTINS FILHO, 2009: 189). O adido militar da embaixada da França em Buenos Aires, em correspondência ao Ministro da Defesa em Paris, afirmou que “‘Tras la revolución de septiembre […], el Ejército argentino está en plena reorganización y es de interés hacer notar que algunos de sus miembros más influyentes se vuelcan hacia Francia en busca de ideas y modelos.’” (LLUMÁ, [s. d.]: 6).

Nesse período, já existiam adidos militares na embaixada da Argentina em Paris. (ROBIN, 2005: 275) A Argentina foi o primeiro país americano a receber a doutrina de combate à GR, quase uma década antes das outras nações, cujos oficiais foram formados em escolas militares estadunidenses principalmente a partir da Revolução Cubana.

Oficialmente, o precursor da introdução desses estudos no país foi o então coronel Carlos Rosas, que retornou da França, onde havia realizado vários estudos in loco, e assumiu, em 1956, a subdireção da Escuela Superior de Guerra, em Buenos Aires.

O general argentino Alcides López Aufranc também foi um dos primeiros militares a serem enviados à França 4 para fazer um treinamento. Lá permaneceu durante dois anos, e, depois, ao regressar à Argentina, se transformou em um dos principais teóricos disseminadores da doutrina de combate à GR.

Em 1957, a escola recebeu, na qualidade de assessores e professores e financiados pelo governo argentino, quatro militares que haviam participado das guerras da Indochina e Argélia, que permaneceram na instituição até 1962.

Durante os anos seguintes, mais de uma centena de oficiais foram enviados à Argélia para realizarem “uma viagem de estudos” (ABRAMOVICI , [s. d.]) e publicou-se uma série de artigos dos militares franceses em revistas castrenses e realizaram-se diversos cursos sobre a guerra revolucionária, destinados à atualização dos oficiais argentinos.

Com o assessoramento dos militares franceses, as Forças Armadas argentinas elaboram o Plan de Conmoción Interna del Estado, ou Plan CONINTES.

O plano foi criado pelo Decreto secreto n. 9.880, de 14 de novembro de 1958, e posto em execução pelo Decreto n. 2.628, de 13 de março de 1960, ambos promulgados pelo então presidente argentino Arturo Frondizi, e previa a possibilidade de conferir às Forças Armadas a prerrogativa de reprimir manifestações populares, assim como determinar que seus responsáveis fossem julgados por tribunais militares.

Além de restringir alguns direitos e garantias constitucionais e habilitar a militarização da sociedade através da declaração como “zonas militarizadas” centros ou cidades de importância estratégica para o governo. Um atentado à bomba contra um capitão do Exército no dia 12 de março de 1960 foi a justificativa para a declaração do “estado CONINTES” pelo presidente Frondizi no dia 14 de março de 1960. Tratou-se de um atentado organizado pelos peronistas, que tinham seu partido político proscrito desde 1955.

Estima-se que durante todo o governo Frondizi, houve 1.566 atentados desse tipo. Em dois de agosto de 1961, o presidente declarou o término do “estado Conintes”, situação que se repetiu em 1962 durante vários meses.

Durante a Conferência dos Exércitos Latino-americanos de 1961, o general Spirito, chefe do Estado-Maior argentino, propõe às demais delegações participantes do evento a ideia de realizar um Curso Interamericano de Guerra Contrarrevolucionaria, que seria dirigido pelo coronel Lopez Aufranc, que havia realizado um curso na Escola Superior de Guerra francesa, do qual participariam 39 oficiais de treze países latino-americanos mais os representantes dos Estados Unidos.

Em correspondência com o governo francês, o embaixador da França na Argentina comenda que o papel dos assessores militares franceses na concepção e elaboração deste curso foi determinante, destacando a presença de militares norte-americanos entre os participantes do evento (ABRAMOVICI , [s. d.]).

Esta missão francesa permanece na Argentina até meados de 1966, quando um setor ligado aos Estados Unidos das Forças Armadas argentinas toma o poder. Uma segunda missão será enviada ao país em 1974. O novo chefe da missão é o coronel Robert Servant, que fora um dos encarregados da 5ª seção do Exército em Argel, e que conhecera em Madrid ao então tenente coronel argentino Reynaldo Bignone.

Servant mantinha-se em permanente contato com Pedro Latanne, chefe do Service de Documentation Extérieure et de Contreespionage (SDECE) para Argentina e Brasil, subordinado ao adido militar francês no Brasil, Paul Aussaresses (ABRAMOVICI , [s. d.]).

No Brasil, os primeiros registros de uma produção autóctone sobre a Guerra Revolucionária datam do final daquela década. Em 1958 foram traduzidos e publicados alguns artigos das revistas francesas Revue Militaire d’Information e da Revue de Défense Nationale.

No ano seguinte, o general Augusto Fragoso ministrou no curso “Estado-Maior e Comando” da Escola Superior de Guerra a palestra “Introdução ao Estudo da Guerra Revolucionária”, resultado de seus estudos da produção francesa em relação à temática, onde afirmava: a bibliografia francesa sobre a Guerra Revolucionária é, pode-se dizer, a única existente. A bibliografia de origem norte-americana não deu até agora ao assunto a importância merecida: nos catorze últimos números consultados da Military Review (de janeiro de 1958 a fevereiro de 1959) não há nenhum estudo, artigo ou tópico que fale, no título, de Guerra Revolucionária, Guerra Insurrecional ou Guerra Subversiva. (MARTINS FILHO, 2004: [s. p.])

No discurso de Fragoso, aparecem outras referências à assimilação da doutrina francesa de combate à Guerra Revolucionária, principalmente no papel das Forças Armadas na política e como condutores desse combate.

Para o militar brasileiro, as autoridades civis, “em face do direito”, dispunham de poucas alternativas quando aos meios legais e às técnicas a aplicar, “enquanto os revolucionários consideram válidos todos os meios imagináveis de luta.”

Havia uma urgência “para combater a subversão, para enfrentar a guerra revolucionária”, sendo necessária uma diferenciação entre os cidadãos e os “militantes da guerra revolucionária”: “não se pode manter em relação aos militantes da guerra revolucionária, o respeito das liberdades individuais asseguradas aos demais cidadãos e as medidas de proteção que beneficiam, na ação judiciária, os delinquentes do direito comum.” Para Fragoso, “o regime democrático característico do mundo livre, e tão prezado por todos nós” não favorece o combate à guerra revolucionária devido ao “abuso de liberdades que, via de regra, propicia ao adversário” (MARTINS FILHO, 2004: [s. p.]).

Em 1961 e 1962, realizaram-se os primeiros intercâmbios de conhecimentos sobre o combate à Guerra Revolucionária entre Argentina e Brasil. O Estado-Maior do Exército, no Rio de Janeiro, organizou, entre agosto e novembro de 1962, um curso de aproximadamente 20 horas cujo conteúdo era uma adaptação do currículo do Primero Curso Interamericano de Guerra Contrarrevolucionaria – que três oficiais brasileiros haviam realizado na Argentina em outubro de 1961, junto a representantes dos Estados Unidos e outros 13 países latinoamericanos.

Dirigido pelo general Aurélio Alves Ferreira e contando com quatro instrutores, o curso teve assistência de 60 oficiais das cinco seções do Estado-Maior, 20 das quatro diretorias do Exército, cinco da Marinha e cinco da Aeronáutica, o curso tinha como objetivo “esclarecer, orientar e recomendar aspectos da conduta militar na atual conjuntura brasileira”, que, segundo os militares, estava marcada pela Guerra Revolucionária em curso.

O curso fazia parte de uma reformulação dos currículos de formação militar no Brasil implementada alguns meses antes pelo chefe do Estado-Maior do Exército, o general Humberto de Alencar Castello Branco, que ressaltava a necessidade de se estudar a Guerra Revolucionária e temas correlatos. (MARTINS FILHO, 2004: [s. p.])

O general Ernesto Geisel era um leitor de Suzanne Labin, uma das teóricas francesas sobre a guerra revolucionária. De acordo com o jornalista Elio Gaspari, Geisel, em um de seus manuscritos, copiou alguns trechos do livro da autora, como “o fascismo é o castigo das democracias que se mostram, não excessivamente severas, mas, ao contrário, excessivamente complacentes com o comunismo”(GASPARI, 2003: 86-87).

De acordo com Gaspari, princípios da GR são encontrados nas obras de Golbery como no capítulo O Planejamento e a Segurança Nacional em A Geopolítica do Poder (GASPARI, 2003: 134 e ss.).

Junto a publicações em revistas militares, a literatura francesa foi amplamente difundida entre os militares das Forças Armadas brasileiras. Nos primeiros anos após o golpe, o debate sobre a guerra revolucionária não manteve o mesmo ímpeto que adquirira na conjuntura anterior à implementação da ditadura, já que não havia resistência de envergadura de grupos opositores, sequer luta armada.

Porém, isto não pode ser apontado como um indício de que os ensinamentos franceses perderam a importância. De acordo com João Roberto Martins Filho, “as ideias emprestadas dos franceses permaneceram como ponto de referência doutrinária no interior das Forças Armadas” (MARTINS FILHO, 2009: 187) e um dos documentos oficiais mais contundentes que evidenciam a assimilação dos ensinamentos franceses é o Inquérito Policial Militar n. 709 (IPM 709).

Tratou-se de uma investigação instaurada no dia 21 de setembro de 1964, sob responsabilidade do coronel Ferdinando de Carvalho, sobre o comunismo no Brasil. No texto do IPM, o coronel e sua equipe, que congregava 21 pessoas divididas nas seções de justiça, seção de estudos e investigações, seção de depoimentos e seção de administração (BRASIL, 1966: 6-7), afirmavam que era necessário extrair lições das derrotas francesas em suas guerras de libertação e apropriar-se seletivamente dos ensinamentos franceses.

Uma figura fundamental para as doutrinas francesas no Brasil foi o general Paul Aussaresses, que, junto com Roger Trinquier, em 1957, eram auxiliares do general Jacques Massu, que liderava a Batalha de Argel.

Aussaresses tornou-se adido militar no Brasil em 1973, por recomendação do representante do Service de Documentation Extérieure et de Contre-espionage (SDECE) da embaixada da França em Brasília. Nesta cidade, estabelece relações com o general João Batista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações, que futuramente ocuparia o cargo de presidente da República. “‘Nos hicimos grandes amigos… Él dirigía junto al comisario Sergio Fleury los escuadrones de la muerte brasileños’” (ROBIN, 2005: 364). Cuando fui nombrado agregado militar en Brasil, en 1973, encontré varios generales que me dijeron: ‘Oh… ¡Los hemos tenido usted como instructor en Fort Bragg!’ - Brasil en esa época estaba gobernado por una junta militar?
- Si, era una dictadura militar, y eso funcionaba… En diez años, los oficiales que yo había formado habían tomado el poder… (ROBIN, 2005: 348)

Esta era a apreciação de Aussaresses sobre a repressão brasileira: El gobierno brasileño libró una lucha sin piedad contra los comunistas entrenados por la Unión Soviética. El comisario Sergio Fleury, que era de origen francés, se puso a perseguir a todo lo que se pareciera a un tipo raro, […]. Los policías arrestaban violentamente a la gente, mientras los escuadrones de la muerte, constituidos por gendarmes y ‘paras’ bastante duros, terminaban el trabajo. (ROBIN, 2005: 365)

Aussaresses afirmou que “tuve una relación muy estrecha con los militares brasileños.

Era una dictadura militar. Brasil ayudó considerablemente la acción del general Pinochet contra Allende” (EL CONCEPTO, [s. d.]). Se Aussaresses tinha este nível de informação sobre a colaboração da ditadura civil-militar de segurança nacional brasileira com os demais países do Cone Sul, torna-se bastante inverossímil pensar que não estivesse a par das operações militares desenvolvidas no Araguaia.

Perguntado por Marie-Monique Robin se ministrou cursos durante sua estada no Brasil, Aussaresses respondeu afirmativamente, complementando: “siempre lo mismo: la batalla de Argel”. Esses cursos foram ministrados em instituições militares, especialmente em um centro de treinamento de forças especiais, localizado em Manaus, estado do Amazonas (ROBIN, 2005: 365), chamado Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS).

O CIGS foi criado através do Decreto n. 53.649, de dois de março de 1964. Na página do Exército brasileiro, afirma-se que o centro disponibiliza vagas “para militares de nações amigas, conforme interesses diplomáticos nacionais.”5

De acordo com o jornal Folha de São Paulo, entre 1966 e 1985, 103 oficiais estrangeiros – argentinos, bolivianos, chilenos, colombianos, equatorianos, espanhóis, estadunidenses, franceses, guatemaltecos, guianeses, mexicanos, panamenhos, paraguaios, peruanos, surinameses e venezuelanos – foram treinados pelo Exército brasileiro “em técnicas de tortura e combate à guerrilha”.

Entre os ex-alunos, estão militares condenados por assassinato, cumplicidade em genocídios e tortura (VEJA, 2008), como o coronel francês Didier Tauzin, que em 1994 liderou a “Operação Chimère” para treinar oficiais hutus no combate aos tutsis em Ruanda, um confronto étnico que resultou em um genocídio de 800 mil vítimas (EXÉRCITO, 2008).

O CIGS era dirigido pelo coronel Jorge Teixeira de Oliveira, que havia realizado um curso no Jungle Operation Training Center, em Fort Sherman, no Panamá.

5 Na página do Exército, consta também um pequeno resumo do conteúdo desses cursos. Cf.
http://www.exercito.gov.br/06OMs/centros/cigs/indice.htm Último acesso: 20 set. 2010.

Aussaresses confirma a presença de alunos estrangeiros no centro, mas não somente como alunos. Havia, além de sua presença como ministrante de aulas sobre a guerra revolucionária, instrutores boinas verdes norte-americanos (ROBIN, 2005: 367).

Aussaresses vai embora do Brasil em 1975 e passa a dedicar-se ao comércio de armas; e, nesta nova missão, com o intermediação britânica, vende material para a realização do Operativo Independencia em Tucumán (ABRAMOVICI , [s. d.]).

A Guerrilha do Araguaia no Brasil, e o Operativo Independencia e a Escuela Mecánica de Armada na Argentina: Paradigmas dos Ensinamentos Franceses

Outro exemplo da incorporação da doutrina francesa sobre a GR pelas ditaduras civilmilitares de segurança nacional argentina e brasileira foi a elaboração das estratégias de implantação do terror desses regimes, que tiveram no combate à Guerrilha do Araguaia (1972-1974) e o Operativo Independencia (1975) seus pontos paradigmáticos.

O primeiro indício é o processo de militarização da estrutura de informação e repressão pré-existentes e a criação de novos órgãos subordinados às Forças Armadas, o que evidencia o paulatino engajamento dos militares na “luta contra a subversão e o terrorismo”.

Em ambos os país, a repressão se organizou a partir da existência de dois níveis de normatividade, combinando métodos legais e clandestinos, agindo paralelamente. Havia uma repressão de caráter público, configurada pelo conjunto de normas sancionadas durante esse período para a consecução dessas, e uma repressão clandestina, composta práticas ilegais fundamentadas em ordenamentos elaborados pelas Forças Armadas. Esta configuração foi chamada pelos pesquisadores argentinos como doctrina del paralelismo global.6

No entanto, há diferenças bastante significativas entre os dois países quanto aos procedimentos legais e clandestinos. No caso brasileiro, prevaleceu o aspecto legal, mesmo que essa legalidade representasse um arbítrio, enquanto que na Argentina a repressão esteve pautada quase que exclusivamente pela clandestinidade, o que se justifica pelos objetivos dos militares: exterminar a dissidência política.

(...)

Bibliografia
CAMPOS FILHO, Romualdo Pessoa. Guerrilha do Araguaia: a esquerda em armas. Goiânia: UFG, 1997.
GASPARI, Elio. A ditadura derrotada. São Paulo: Cia. das Letras, 2003.
LLUMÁ, Diego. Los maestros de la tortura. Todo es historia, n. 422.
MÁNTARAS, Mirta. Genocidio en Argentina. Buenos Aires: do autor, 2005.
MARTINS FILHO, João Roberto. A influência doutrinária francesa sobre os militares brasileiros nos anos de 1960. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 23, n. 67, jun. 2008. p. 39-50.
___________. Tortura e ideologia: os militares brasileiros e a doutrina de guerre révolutionnaire (1959-1974). In: SANTOS, Cecília Macdonell, TELES, Edson, TELES, Janaína de Almeida (orgs.). Desarquivando a ditadura: memória e justiça no Brasil. São Paulo: Hucitec, 2009. v. 1.
MARTYNIUK, Claudio. ESMA: fenomenología de la desaparición. Buenos Aires: Prometeo, 2004.
MIGNONE, Emilio F., McDONNELL, Augusto Conte. Estrategia represiva de la dictadura militar: la doctrina del paralelismo global. Buenos Aires: Colihue, 2006.
MORAIS, Taís, SILVA, Eumano. Operação Araguaia. São Paulo: Geração Editorial, 2011.
ROBIN, Marie-Monique. Escuadrones de la muerte: la escuela francesa. Buenos Aires: Sudamericana, 2005.
STUDART, Hugo. A lei da selva. São Paulo: Geração Editorial, 2006.
VERBITSKY, Horacio. El vuelo. Buenos Aires: Sudamericana, 2004.
VV. AA. Ese infierno: conversaciones de cinco mujeres sobrevivientes de la ESMA. Buenos Aires: Altamira, 2006.

Documentos

BRASIL. Ato Institucional n. 5 de 13 de dezembro de 1968. Diário Oficial da União, Brasília, 13 dez. 1968, p. 10.801.
__________. Decreto n. 5.584 de 18 de novembro de 2005. Dispõe sobre o recolhimento ao Arquivo Nacional dos documentos arquivísticos públicos produzidos e recebidos pelos extintos Conselho de Segurança Nacional (CSN), Comissão Geral de Investigações (CGI) e Serviço Nacional de Informações (SNI), que estejam sob a custódia da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). Diário Oficial da União, 19 nov. 2005.
__________. Decreto-lei n. 314 de 13 de março de 1967. Define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social e dá outras providências. Diário Oficial da União, 13 mar.
1967.
__________. Decreto-lei n. 898 de 29 de setembro de 1969. Define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências. Diário Oficial da União, 29 set. 1969.
__________. Inquérito Policial Militar n. 709: o comunismo no Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1966. v. 1.
__________. Lei n. 6.620 de 17 de dezembro de 1978. Define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências. Diário Oficial da União, 17 dez. 1978.
__________. Lei n. 7.170 de 14 de dezembro de 1983. Define os crimes contra a segurança
nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras
providências. Diário Oficial da União, 14 dez. 1983.
__________. Presidência da República. Conselho de Segurança Nacional. Secretaria-geral.
Ata da 41ª seção do Conselho de Segurança Nacional, realizado em 11 de julho de 1968.
Arquivo Nacional/Rio de Janeiro.
__________. Presidência da República. Conselho de Segurança Nacional. Secretaria-geral.
Ata da 43ª seção do Conselho de Segurança Nacional, realizada em 13 de dezembro de 1968. Arquivo Nacional/Rio de Janeiro.

Teses

BAUER, Caroline Silveira. Um estudo comparativo das práticas de desaparecimento nas ditaduras civil-militares argentina e brasileira e a elaboração de políticas de memória em ambos os países. Porto Alegre/Barcelona. UFRGS/UB, 2011. 445 f. Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-graduação em História/Departament d’Història Contemporània, Universidade Federal do Rio Grande do Sul/Universitat de Barcelona, Porto Alegre/Barcelona, 2011.

Sites

ABRAMOVICI, Pierre. La doctrina francesa y el terror em América Latina. Disponível em: http://www.elortiba.org/soja.html Último acesso: 20 set. 2010.
EL CONCEPTO de subversión. Disponível em: http://www.elortiba.org/soja.html Último acesso: 20 set. 2010.
LA ESCUELA francesa. Entrevista com Marie-Monique Robin. Disponível em:
www.revistalote.com.ar Último acesso: 20 set. 2010.
LEMOINE, Maurice. Da guerra colonial ao terrorismo de Estado. Le Monde Diplomatique
Brasil, 1 nov. 2004. Disponível em: http://diplomatique.uol.com.br/ Último acesso: 21 set. 2010.
MARTINS FILHO, João Roberto. A educação dos golpistas: cultura militar, influência francesa e golpe de 1964. Paper apresentado no “International Symposium ‘The cultures of dictatoryship: Historical reflections on the Brazilian golpe of 1964’”. University of Maryland, 14-16 out. 2004. Disponível em: http://www.history.umd.edu/HistoryCenter/2004- 05/conf/Brazil64/program.html Acesso: 27 mar. 2005.

Jornais e Revistas

EXÉRCITO ensinou tortura a estrangeiros durante a ditadura. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 jun. 2008.
OLIVEIRA-CÉZAR, María. El aprendizaje de la guerra contrarrevolucionaria. Todo es historia, n. 435.
VEJA lista dos alunos estrangeiros do Centro de Instrução de Guerra na Selva. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 jun. 2008.

Sobre a Autora:

* Caroline Silveira Bauer: Professora de História e historiadora, doutora em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pela Universitat de Barcelona. Consultora técnica da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

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